O inspirador exemplo da escritora moçambicana Paulina Chiziane, ganhadora do Prêmio Camões de Literatura de 2021
"Estava aqui preparando a minha verdura e, de repente, alguém me liga... Estava muito tranquila na minha vida camponesa. Então recebo a notícia. Só sei dizer que a verdura que normalmente faço, com aquele gosto, aquele requinte, porque sou eu mesma quem vai comer, acabou queimada". O relato que transborda simplicidade é da moçambicana Paulina Chiziane, sentada no terreiro de casa, ao lado de uma fogueira, em vídeo que viralizou na internet, ao contar como recebeu a notícia de que havia ganhado o Prêmio Camões 2021, a maior honraria da literatura em língua portuguesa.
Primeira mulher a publicar um romance em Moçambique, Paulina Chiziane estreou na literatura há 31 anos, com o livro "Balada de Amor ao Vento". A escritora tem como marca em sua obra a voz de uma memória coletiva e o acolhimento do outro. "Eu nunca falei nos livros na minha voz pessoal. Mesmo nos livros em que escrevo na primeira pessoa, estou a trazer a voz coletiva. Portanto, é todo um povo que é agraciado por este grande prêmio", conta. Paulilna Chiziane não gosta de ser chamada de romancista e prefere definir-se como "uma contadora de histórias".
A escritora nasceu na cidade de Manjacaze, em 1955, e cresceu nos subúrbios de Maputo, a capital de Moçambique. Paulina graduou-se em linguística e, na juventude, participou da Frente de Libertação de Moçambique. Entre 1977 e 1992, durante a guerra civil em seu país, atuou na Cruz Vermelha Internacional. Após o fim desse período, passou a trabalhar no Núcleo das Associações Femininas da Zambézia. Hoje, atua como consultora e desenvolve projetos de ajuda internacional, com foco em conflitos e defesa dos direitos das mulheres.
Paulina atribui à sorte o fato de ter ido à escola, aprendido a ler e escrever, caminhado pelo país e, "vindo do chão", ser hoje uma escritora reconhecida. "Um reconhecimento pra alguém que veio de lugar nenhum, sem dúvida, é um motivo de inspiração para uma outra geração", afirma.
Prêmio Camões de Literatura
O Prêmio Camões de Literatura foi instituído em 1988, em iniciativa dos governos do Brasil e Portugal, com o objetivo de consagrar um autor de língua portuguesa que, pelo conjunto de sua obra, tenha contribuído para o enriquecimento do patrimônio literário e cultural de sua língua comum.
Considerado o mais importante prêmio da língua portuguesa, contempla anualmente autores da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). A comissão julgadora é composta por representantes do Brasil, de Portugal e de países africanos de língua oficial portuguesa.
Lista de agraciados:
2021 • Paulina Chiziane (Moçambique)
2020 • Vítor Manuel de Aguiar e Silva (Portugal)
2019 • Chico Buarque de Hollanda (Brasil)
2018 • Germano Almeida (Cabo Verde)
2017 • Manuel Alegre (Portugal)
2016 • Raduan Nassar (Brasil)
2015 • Hélia Correia (Portugal)
2014 • Alberto da Costa e Silva (Brasil)
2013 • Mia Couto (Moçambique)
2012 • Dalton Trevisan (Brasil)
2011 • Manuel António Pina (Portugal)
2010 • Ferreira Gullar (Brasil)
2009 • Armênio Vieira (Cabo Verde)
2008 • João Ubaldo Ribeiro (Brasil)
2007 • António Lobo Antunes (Portugal)
2006 • Luandino Vieira (Angola)
Obs: Prêmio recusado pelo autor
2005 • Lygia Fagundes Telles (Brasil)
2004 • Agustina Bessa-Luís (Portugal)
2003 • Rubem Fonseca (Brasil)
2002 • Maria Velho da Costa (Portugal)
2001 • Eugênio de Andrade (Portugal)
2000 • Autran Dourado (Brasil)
1999 • Sophia de Mello Breyner Andresen (Portugal)
1998 • Antonio Cândido de Melo e Sousa (Brasil)
1997 • Artur Carlos M. Pestana dos Santos, o Pepetela (Angola)
1996 • Eduardo Lourenço (Portugal)
1995 • José Saramago (Portugal)
1994 • Jorge Amado (Brasil)
1993 • Rachel de Queiroz (Brasil)
1992 • Vergílio Ferreira (Portugal)
1991 • José Craveirinha (Moçambique)
1990 • João Cabral de Melo Neto (Brasil)
1989 • Miguel Torga (Portugal)